De janeiro a outubro deste ano, 64.471 brasileiros morreram vítimas de AVC, o que equivale a uma morte a cada seis minutos, segundo o Portal da Transparência dos Cartórios de Registro Civil. Em 2024, o país registrou 85.457 mortes, mantendo o Brasil entre as nações com maior carga da doença no mundo.
O impacto também é financeiro: entre 2019 e setembro de 2024, o tratamento hospitalar de pacientes com AVC custou R$ 910 milhões, com mais de 85 mil internações — um em cada quatro pacientes precisou de UTI, de acordo com levantamento da consultoria Planisa.
Neste 29 de outubro, Dia Mundial do AVC, médicos reforçam que oito em cada dez casos poderiam ser evitados com medidas simples: controle da pressão arterial, abandono do cigarro e prática regular de exercícios físicos. “O AVC é súbito e devastador, mas a maioria dos casos é evitável. O problema é que fatores de risco como hipertensão e cigarro ainda são mal controlados”, alerta o neurocirurgião Hugo Doria, do Hospital Santa Catarina.
Doria destaca que a pressão alta é o principal fator de risco e, ao mesmo tempo, o mais negligenciado: “A hipertensão é silenciosa, mas responde bem ao tratamento quando há adesão e acompanhamento médico”.
O AVC isquêmico, responsável por 85% dos casos, ocorre quando há entupimento de vasos sanguíneos que levam sangue ao cérebro. Já o hemorrágico, menos comum porém mais grave, surge com a ruptura de um vaso, causando sangramento no tecido cerebral. “No isquêmico há bloqueio da artéria e morte de células cerebrais; no hemorrágico, o sangue extravasa por um rompimento”, explica o neurocirurgião Feres Chaddad, da Unifesp e da Beneficência Portuguesa.
Os sintomas aparecem de forma súbita: sorriso torto, fraqueza em um dos lados do corpo, dificuldade para falar, perda de visão e tontura. O teste “SAMU” ajuda a identificar rapidamente os sinais — Sorriso, Abraço, Música e Urgente — lembrando que cada minuto conta. “Tempo é cérebro, porque milhares de neurônios morrem a cada minuto”, reforça Chaddad.
O tratamento deve começar em até quatro horas após o início dos sintomas, podendo envolver o uso de trombolíticos ou trombectomia mecânica.
A Sociedade Brasileira de AVC aponta um aumento de 66% nos casos isquêmicos entre pessoas com menos de 45 anos na última década. O neurocirurgião Orlando Maia, do Hospital Quali Ipanema, associa o fenômeno ao estilo de vida moderno: “Hoje vemos AVC em pessoas de 30 e 40 anos. O sedentarismo, o cigarro eletrônico, anticoncepcionais e dietas desbalanceadas elevam a pressão e inflamam os vasos”.
Feres Chaddad acrescenta que o risco cresce entre jovens por doenças cardíacas, uso de anabolizantes e pela combinação de cigarro e anticoncepcionais hormonais, que multiplica por até dez o risco de trombose. “Nas mulheres, a mistura de enxaqueca com aura, anticoncepcional e cigarro é especialmente perigosa. Entre os homens, o abuso de hormônios em academias virou uma nova preocupação”, alerta.
O diagnóstico é feito por tomografia ou ressonância magnética, e a recuperação pode ocorrer com reabilitação multidisciplinar. “O cérebro tem uma capacidade de adaptação impressionante, especialmente nos primeiros meses após o evento”, diz Doria.
Ainda assim, os especialistas concordam: a prevenção é o melhor tratamento. “Mesmo com todos os avanços, nada é tão eficaz quanto evitar o primeiro AVC”, resume o médico.