Até esta quinta-feira (27), quando "Cruella" estreia nos cinemas brasileiros, era difícil pensar na vilã de cabelo bicromático da Disney sem lembrar da atuação de Glenn Close em "101 dálmatas", a versão de 1996 com atores do clássico animado de 1961.
Quer dizer, pelo menos para grande parte do público – mas não para o diretor do novo filme sobre a origem da personagem. Relutante, mas com um sorriso no rosto, ele confessa que nunca viu a produção de 25 anos atrás.
"Eu provavelmente não deveria falar isso, mas eu não assisti a esse filme", conta o cineasta australiano Craig Gillespie ("Eu, Tonya") em entrevista ao G1.
A versão estrelada por Close não foi um fenômeno com público e crítica no lançamento, mas o trabalho da americana como a vilã que queria transformar filhotes em casaco marcou o suficiente para garantir uma sequência em 2000 – e seu papel como produtora da nova história, que também pode ser assistido na plataforma de vídeos Disney+, por R$ 69,90, a partir desta sexta-feira (28).
"Eu não queria contaminar minha visão, sabe? Porque eu sinto que a história é tão separada. É essa coisa punk dos anos 1970 e é uma criação tão própria, que eu não queria meio que ter outros pensamentos ou ideias sobre o que esse personagem deveria ser."
Com Emma Stone ("La La Land: Cantando estações") encabeçando o elenco, o filme retrata a formação daquela que viria a ser a grande vilã do livro "Os cento e um dálmatas", da britânica Dodie Smith, que serviu de inspiração para as duas versões da Disney.
Com isso, "Cruella" pode ser considerada uma história de origem padrão – mas não para o estúdio conhecido por décadas por suas animações infantis. Ao retratar as dificuldades de uma jovem órfã e sua busca por vingança, é mais sombria e busca um público um pouco mais velho do que as obras originais.
"Enquanto todos chegavam e começavam a trabalhar e decidir e pensar no visual eu falei: 'Não pensem nisso como um filme da Disney. Estamos apenas fazendo essa história de amadurecimento dessa mulher na Londres dos anos 1970 e vamos nessa'", diz Gillespie.
"É definitivamente sombrio para um filme da Disney. Talvez não como um filme realmente intenso para maiores de idade, mas é mais sombrio do que eu já vi na Disney por um bom tempo", afirmou Stone, que interpreta a protagonista, em coletiva de imprensa.
Para enfrentar a (anti)heroína, o estúdio escalou outra Emma, a Thompson ("MIB: Homens de Preto - Internacional"), que se divertiu no papel.
"Principalmente porque eu acho que tenho pedido há um bom número de anos se podia ser uma vilã. Passei décadas interpretando o que minha mãe costumava chamar 'mulheres boazinhas de vestido'. E agora eu posso viver uma mulher muito maligna – de vestido, mas, oh, que vestidos", disse a veterana britânica.
Emma Thompson em cena de 'Cruella' — Foto: Divulgação
Aos 53 anos de idade, Gillespie se juntou à produção até mesmo depois da protagonista. Com nenhuma experiência em filmes infantis no currículo, ele substituiu o diretor original, Alex Timbers, que teve de deixar o projeto por conflitos de agenda.
Talvez até por isso ele tenha decidido que valia a pena correr certos riscos.
"Quase da mesma forma como me arrisquei em 'Eu, Tonya', eu queria apenas gravar algo pelo qual eu ficaria animado, que eu sentia que seria divertido, e que eu realmente gostaria de ver no cinema em um sábado à noite. Então eu apenas me joguei. Estava esperando que alguém dissesse 'não', mas ninguém disse", brinca o australiano.
Isso não quer dizer, no entanto, que o cineasta confie apenas no instinto. Com tanta importância a figurinos, maquiagens e penteados, ele dedicava grande parte de seu tempo ao planejamento do que ia gravar.
Joel Fry, Paul Walter Hauser e Emma Stone em cena de 'Cruella' — Foto: Divulgação
"Mando esboços de gravação de todo o filme para os chefes de departamento antes, para que eles saibam por onde a câmera vai passar, o que ela está fazendo", diz o diretor.
Parece contraditório, mas ele conta que, com tudo isso pronto, tem mais liberdade para buscar outras ideias com os atores durante a gravação.
"Eu intencionalmente tenho atores que são bons em improvisar. Eles trazem coisas também. Particularmente quando você lida com Joel Fry, Paul Walter Hauser e Emma Stone juntos", lembra Gillespie.
"Como em uma das primeiras cenas com o bolo de aniversário. Eu entrei e falei: 'podemos escrever Judy no bolo, e que ele tenha sido roubado?'. Isso não estava no roteiro. E então se tornou essa coisa toda, e ela pergunta quem é Judy e o Paul fala: 'não importa. Ela deve estar com fome'. Eles improvisam todas essas coisas e isso faz parecer vivo."