O Vale do Silício, epicentro da tecnologia nos Estados Unidos, vive intenso debate sobre a possibilidade de uma bolha no setor de inteligência artificial (IA). Céticos e analistas questionam se a valorização recorde das empresas de IA reflete realmente a demanda por tecnologia ou se é resultado de “engenharia financeira” e acordos complexos entre companhias.
Sam Altman, CEO da OpenAI, comentou à BBC que, embora seja possível que investidores cometam erros e startups sem futuro lucrem, "algo de verdade está acontecendo" em sua empresa. A OpenAI, responsável pelo ChatGPT, está no centro de contratos e investimentos bilionários, incluindo acordos recentes com a Nvidia, AMD, Microsoft e Oracle, que somam centenas de bilhões de dólares. O projeto Stargate, no Texas, apoiado pelo SoftBank e anunciado na Casa Branca durante o governo de Donald Trump, também cresce a cada mês.
Alertas sobre riscos financeiros vieram de instituições como o Banco da Inglaterra, o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o presidente do JP Morgan, Jamie Dimon, que afirmou à BBC que "o nível de incerteza deveria estar mais presente na mente da maioria das pessoas". No Vale do Silício, o pioneiro Jerry Kaplan lembrou que já presenciou quatro bolhas e alertou: “Quando estourar, vai arrastar a economia junto”, destacando que o volume de recursos envolvidos é muito maior do que na bolha das empresas “ponto com”.
O crescimento do setor é visível: empresas de IA representaram 80% dos ganhos surpreendentes da Bolsa americana neste ano, e a consultoria Gartner projeta que os gastos globais com IA alcançarão US$ 1,5 trilhão até o fim de 2025 — quase 70% do PIB brasileiro. Entretanto, especialistas apontam que, embora a receita da OpenAI cresça rapidamente, a empresa ainda não registrou lucro, e alguns analistas alertam para o risco de “financiamento circular”, quando investidores emprestam recursos a seus próprios clientes para inflar a demanda artificialmente.
O impacto ambiental também é preocupação. Data centers de IA, essenciais para treinar e operar modelos como o ChatGPT, consomem energia equivalente à de milhões de residências. No Brasil, os 162 centros existentes têm capacidade instalada entre 750 MW e 800 MW, semelhante ao consumo de uma cidade de 2 milhões de habitantes. A projeção para 2038 indica demanda equivalente à de uma cidade de 43 milhões de habitantes, quase quatro vezes a população de São Paulo.
Apesar dos riscos financeiros e ambientais, há quem veja oportunidades de longo prazo. Jeff Boudier, do hub de IA Hugging Face, compara o cenário à expansão da internet: "Se há excesso de investimento em infraestrutura para IA, pode haver riscos financeiros, mas isso viabilizará novos produtos e experiências que ainda não imaginamos." O desafio agora é determinar se a euforia atual, marcada por contratos bilionários e investimentos complexos, pode sustentar um crescimento real ou se o setor se aproxima de um estouro.