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Domingo, 31 de janeiro de 2021 - 10:46:34
Sintep cita usurpação da AL e aciona TJ contra lei que permite escolas militares
INCONSTITUCIONALIDADE
Lei deveria ser proposta pelo governador e não por deputado; Sindicato fala em modelo excludente

Com menos de 40 dias da publicação de uma lei apresentada pelo deputado estadual Silvio Fávero (PSL) para regulamentar o funcionamento e a criação ou transformação das Escolas Estaduais da Polícia Militar Tiradentes e das Escolas Estaduais do Corpo de Bombeiros Militar Dom Pedro II, o assunto já foi judicializado. No dia 25 deste mês aportou no Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) impetrada pelo Sindicato dos Trabalhadores do Ensino Público (Sintep-MT) pedindo que seja declarada a inconstitucionalidade da Lei nº 11.273/2020. No polo passivo (réu) foram acionados o Estado e a Assembleia Legislativa.

O argumento utilizado pela assessoria jurídica do Sintep-MT é o mesmo que o governador Mauro Mendes (DEM) costuma usar ao vetar algumas leis aprovadas na Assembleia Legislativa: vício jurídico que configura inconstitucionalidade formal por usurpação de competência exclusiva do chefe do Poder Executivo. Em outras palavras, a lei precisa ser proposta pelo governador e não por um deputado como foi feito. Ainda assim, a norma foi aprovada pelos deputados e sancionada no dia 18 de dezembro de 2020 por Mauro Mendes. Nesse caso, ele não vetou o projeto por vício de iniciativa, a exemplo do que fez recentemente  com a lei que isenta da contribuição previdenciária de 14% os aposentados e pensionistas que ganham até R$ 6,1 mil. 

Com isso, coube ao Sindicato dos Trabalhadores da Educação buscar a Justiça pedindo que o Tribunal de Justiça derrube a eficácia da norma. Quem assina a peça é o advogado Bruno José Ricci Boaventura. “A ingerência do Poder Legislativo do Estado de Mato Grosso pode ser observada, ainda, quando dispõe competências e atribuições a serem executadas pela Secretaria de Estado de Educação - SEDUC, da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros Militar do Estado de Mato Grosso e pelo Conselho Deliberativo da Comunidade Escolar. Isto porque trata-se igualmente de competência legislativa de iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo”, afirma o jurista em trecho da peça inicial. 

Na ADI, o representante jurídico do Sintep enfatiza que qualquer atuação do Poder Legislativo para alterar proposição legislativa cuja iniciativa privativa do chefe do Poder Executivo tenha sido observada, somente é admitida quando não importar em aumento de despesas, o que não ocorre no caso da Lei n° 11.273. Consta no artigo 6º da lei estadual que as Escolas Estaduais Militares exigirão o material escolar individual e uniforme diferenciado dos alunos de cada ano letivo, dadas as características próprias do estabelecimento de ensino. Contudo, o parágrafo único prevê que “os estudantes reconhecidos como hipossuficientes, nos termos da legislação vigente, terão direito a um kit uniforme e material escolar gratuitamente, oriundo da dotação orçamentária do Estado, no início do ano letivo”. 

“Não se trata de alteração de projeto de lei sujeito ao processo legislativo pelo detentor da prerrogativa, mas a absoluta usurpação da competência privativamente deferida ao chefe do Poder Executivo”, esclarece o advogado. De acordo com os argumentos apresentados pela parte autora, à medida que a Lei nº 11.273/2020 decorre de projeto de lei de iniciativa que não observa a competência privativa do chefe do Poder Executivo para dispor sobre o regime jurídico dos servidores públicos, bem como acerca de atribuições ou obrigações a órgãos públicos, “faz-se impositivo o deferimento do pedido liminar deduzido nesta Ação Direta de Inconstitucionalidade e, ao término do seu julgamento, o provimento integral dos pedidos deduzidos”. 

PEDIDO DE LIMINAR 

O Sintep-MT pleiteia uma liminar para derrubar a eficácia da lei sob o argumento de que o perigo da demora “é permanente e resta evidenciado no prejuízo institucional decorrente da norma impugnada que, apesar de conter nítida inconstitucionalidade, está em vigência e sua aplicação prejudica toda a Administração Pública Estadual”. Dessa forma, o autor pleiteou uma decisão provisória para suspender a eficácia da lei proposta por Silvio Fávero até o julgamento final da ação. A ADI está sob relatoria da desembargadora Nilza Maria Pôssas de Carvalho, no Órgão Especial, instância colegiada do Tribunal de Justiça composta por 13 magistrados. 

MODELO EXCLUDENTE 

Em entrevista ao FOLHAMAX, a secretária-adjunta de Políticas Sociais do Sintep-MT, Maria Aparecida Arruda Cortez, a Cida Cortez, explicou os motivos pelos quais os profissionais são contra a militarização de escolas estaduais nos moldes em que estão sendo propostos, de transformar escolas que estavam em pleno funcionamento em escolas miliares.  “A escola militar fere o princípio das escolas públicas, é uma escola excludente, que faz seleção e escolhe os melhores estudantes. Portanto, ela não segue os princípios de uma escola pública, a escola pra todos. É uma escola que não faz parte do sistema estadual de educação”, afirma Cortez. 

A representante do Sintep esclarece que a categoria não é contra a existência das escolas militares em Mato Grosso, mas desde que elas utilizem recursos da Secretaria Estadual de Segurança Pública (Sesp-MT) e coloque restrições ao escolher quais alunos podem serão aceitos. “Se os militares quiserem ter a escola, não temos contrariedade com relação a existência da escola militar desde que seja pela segurança pública, financiada pelos recursos da Segurança Pública. Ela não pode ser financiada com recursos de desenvolvimento educacional e principalmente pelos regramentos colocados  que eles são de princípios que não são princípios da escola pública”, relata a professora. 

Dentre esses princípios, ela aponta a seleção, o controle rígido e contesta a alegação de que somente as escolas militares seriam capazes de apresentar melhores resultados quanto ao Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb). “Uma das questões que eles colocam é pra melhoria do Ideb, mas isso não tem nada comprovado. Nós temos escolas públicas estaduais com gestão democrática, com os princípios democráticos que são tão boas quanto as outras. Então, não se justifica. Se os militares quiserem ter suas escolas eles têm a liberdade de criar suas escolas, construí-las e população que assim desejar colocar seus filhos pode buscar essas escolas. O que não pode é eles desativarem uma escola tradicional, uma escola em funcionamento pleno que tem resultados bons e importantes pra poder montar uma que eles querem. Esses são alguns pontos que a gente tem em contrariedade a esse modelo”, explicou Cida Cortez.

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