O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), tornou pública a íntegra da gravação de uma reunião realizada no dia 5 de julho de 2022, no Palácio do Planalto, na qual que o ex-presidente Jair Bolsonaro(PL) e ministros discutem o que a Polícia Federal chama de uma "dinâmica golpista". Trechos do encontro foram divulgados nesta sexta-feira com exclusividade pela colunista Bela Megale, do GLOBO.
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Íntegra da reunião de Bolsonaro investigada pela PF onde se discutiu ataques à democracia
Apreendido no computador do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, a reunião ministerial é considerada peça central para montar a operação deflagrada pela Polícia Federal, e foi marcada por reações de nervosismo, ofensas, palavrões e destempero do então presidente. No encontro com ministros e aliados, o ex-chefe do Executivo, segundo a PF, "revela o arranjo de dinâmica golpista, no âmbito da alta cúpula do governo".
A reunião ocorreu dias antes do encontro que Jair Bolsonaro teve com embaixadores, marcada por ataques ao sistema eleitoral, que gerou a condenação do ex-presidente pelo TSE por abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação.
Em um certo momento da reunião, o ex-ministro da Defesa Paulo Sérgio Nogueira afirmou que a pasta estava na "linha de contato com o inimigo", ao participar da comissão eleitoral do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A participação dos militares na comissão ocorreu a convite do então presidente do TSE, Luís Roberto Barroso, com o intuito de dar mais transparência ao processo e de evitar questionamentos por parte do ex-presidente Bolsonaro e do seu entorno.
Na reunião em que Bolsonaro instiga uma ação dos ministros antes das eleições, temendo perder a disputa, Nogueira dá um panorama sobre como tem sido a ação dos militares na comissão.
— O que eu sigo nesse momento é apenas na linha de contato com o inimigo. Ou seja, na guerra, tem a linha de contato, linha de partida, vou romper aqui e iniciar a minha operação. Eu vejo as Forças Armadas e o Ministério da Defesa nessa linha de contato. Nós temos que intensificar e ajudar nesse sentido para que a gente não fique sozinho no processo — afirmou.
Na reunião, Augusto Heleno afirmou que se "tiver que virar a mesa é antes das eleições". No encontro, o então ministro também afirmou que era necessário agir "contra determinadas instituições e contra determinadas pessoas".
— Não vai ter revisão do VAR. O que precisa ser feito, precisa ser feito antes das eleições. Se tiver que dar soco na mesa é antes das eleições, se tiver que virar a mesa é antes das eleições. Depois das eleições será muito difícil que tenhamos alguma nova perspectiva, eles vão fazer tão bem feito, a conversa do [ministro do STF Edson] Fachin foi com os embaixadores para eliminar as condições de o VAR acontecer. No dia seguinte, todo mundo reconhece e fim de papo — declarou Heleno na ocasião.
Para a PF, a fala "evidencia a necessidade de os órgãos de Estado vinculados ao governo federal atuarem para assegurar a vitória do então presidente".
Em outro trecho, Heleno disse aos presentes que conversou com o diretor-adjunto da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) “para infiltrar agentes nas campanhas eleitorais”, sendo calado na sequência por Bolsonaro, que afirmou que essa informação deveria ser passada somente a ele.
O ex-ministro da Justiça Anderson Torres afirmou que eles iriam "se foder" em caso de uma vitória do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. De acordo com Torres, todos os presentes tinham "medo" porque o cenário era "ameaçador".
Na reunião, Torres fez referência a uma fala anterior de Bolsonaro, sobre a ex-presidente interina da Bolívia Jeanine Áñez, que foi presa sob a acusação de participar de um golpe.
O ex-ministro, em um momento do encontro, afirmou que atuaria junto à Polícia Federal para cumprir a ordem de Bolsonaro para tentar agir antes das eleições. Ele também afirmou serem verdadeiras as informações de que o PT teria ligações com a facção criminosa PCC.
Durante a reunião, Jair Bolsonaro traçou inúmeras críticas ao sistema eleitoral, ao STF e a Lula. O ex-presidente pediu aos ministros para tomarem atitudes antes das eleições, admitindo que seria derrotado nas urnas. Em fala conspiratória, ele sugere que a cadeira da presidência não é para homens como ele, e que a primeira eleição teria sido uma "cagada do bem".
— Como é que eu ganho uma eleição, um fodido como eu? Deputado do baixo clero, escrotizado dentro da Câmara, sacaneado, gozado, uma porra de um deputado — argumentou Bolsonaro.