Foto: REUTERS/Evelyn Hockstein
Thursday, 30 de October de 2025 - 14:20:18
Acordo entre EUA e China traz alívio global e reflexos mistos para o Brasil
TRÉGUA COMERCIAL ENTRE POTÊNCIAS

Os Estados Unidos e a China anunciaram uma trégua comercial que promete aliviar parte das tensões entre as duas maiores economias do mundo. Washington concordou em reduzir as tarifas médias sobre produtos chineses para 47%, cerca de dez pontos percentuais abaixo do patamar anterior, enquanto Pequim suspenderá por um ano as restrições à exportação de terras raras, retomará a compra de soja americana e intensificará o combate ao tráfico de fentanil.

Segundo analistas, o entendimento oferece um fôlego temporário às cadeias globais de suprimentos e ao comércio internacional. O acordo, contudo, também redistribui efeitos — positivos e negativos — entre economias como a brasileira.

Terras raras e cadeia tecnológica

As terras raras, essenciais para setores de tecnologia, defesa e mobilidade, foram um dos principais pontos de impasse nas disputas entre os dois países. A China, responsável por grande parte da extração e do refino desses minerais, havia imposto restrições que afetaram empresas no mundo inteiro, evidenciando a dependência global desses insumos.

Com a trégua, indústrias que dependem da importação desses elementos ganham previsibilidade. “As terras raras são agora o instrumento mais eficaz que a China pode acionar”, explicou Zongyuan Zoe Liu, pesquisadora do Council on Foreign Relations, à ABC News. Ela pondera, porém, que Pequim busca aproveitar essa vantagem enquanto ainda tem peso global.

No Brasil, a exploração de minerais críticos ainda é voltada principalmente à exportação de matéria-prima, como ocorre em Serra Verde (GO), sem avanço na cadeia produtiva.

Chips e indústria global

Outro ponto sensível é o setor de semicondutores. Embora não tenha sido tratado diretamente no encontro, a exportação de chips da americana Nvidia — responsável por tecnologias usadas em sistemas de inteligência artificial como o ChatGPT — continua no centro das preocupações.

Cerca de 25% das vendas da Nvidia dependem do mercado chinês, e a interdependência entre os dois lados força negociações contínuas. “Os chineses precisam desses chips, e as empresas americanas não querem perder o mercado”, destacou José Roselino, professor da UFSCar.

A falta de chips já vem afetando a produção automotiva global. “A Honda no México teve de interromper a fabricação, e o Brasil teme seguir o mesmo caminho. Com o acordo, essas restrições tendem a diminuir ou ao menos aliviar”, afirmou Felipe Tavares, economista-chefe da BGC Liquidez.

Impactos para o Brasil

Para o agronegócio brasileiro, a retomada das compras de soja americana pela China pode reduzir a demanda pelo produto nacional. O Tesouro dos EUA confirmou que os chineses adquirirão, no mínimo, 25 milhões de toneladas métricas por ano nos próximos três anos.

No primeiro semestre de 2025, os portos de Santos, Paranaguá, Rio Grande e São Francisco do Sul concentraram 66% das exportações brasileiras de soja à China. Em setembro, os embarques cresceram 29,9% em relação ao ano anterior, atingindo 10,96 milhões de toneladas — o equivalente a 85% do total importado pelo país asiático.

Roselino explica que os produtores de soja dos EUA são base política importante para Donald Trump e vinham sofrendo com as restrições chinesas. “Resolver isso era essencial para o equilíbrio político interno americano”, observou o professor, ressaltando que o Brasil pode ganhar espaço no mercado, mas também enfrenta maior concorrência.

Diplomacia e próximos passos

Após o encontro, Lula classificou a conversa com Trump como “surpreendentemente boa” e afirmou que pretende negociar a suspensão das tarifas impostas pelos EUA. O chanceler Mauro Vieira acrescentou que o governo brasileiro quer tratar de “todos os setores e áreas de comércio bilateral, além de minerais críticos e terras raras”.

Trump elogiou Lula, mas ponderou que a boa relação entre os dois não garante automaticamente a redução das tarifas.

Para os especialistas, o entendimento entre EUA e China tende a normalizar parte do comércio internacional, reduzindo incertezas e volatilidade nos mercados. Ainda assim, o Brasil pode enfrentar desafios se os norte-americanos passarem a ocupar posições privilegiadas em setores agrícolas e industriais.

Texto/Fonte: G1