Em meio à tensão crescente gerada pela ameaça de sobretaxa às importações brasileiras, diplomatas brasileiros passaram a defender uma preparação cuidadosa antes de um possível telefonema entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. O alerta foi dado por integrantes da comitiva de senadores que estão em missão diplomática em Washington, tentando articular apoio junto a parlamentares e empresários americanos.
O principal receio dos diplomatas é que um contato direto entre os presidentes, sem uma articulação prévia sólida, resulte em episódios semelhantes aos vividos recentemente no Salão Oval com líderes como Volodymyr Zelensky, da Ucrânia, e Cyril Ramaphosa, da África do Sul — este último alvo de um episódio em que Trump exibiu supostos vídeos de um “genocídio branco”, sem comprovação de veracidade.
“A ligação entre presidentes não se improvisa, ainda mais em um cenário de crise. É necessário ter uma costura bem amarrada”, disse um diplomata ouvido pela GloboNews sob reserva. Ele lembrou que ambos os líderes já demonstraram disposição para conversar, mas reforçou que o improviso pode ser prejudicial nesse momento.
A situação se agravou com a iminente aplicação de uma tarifa de 50% sobre produtos brasileiros anunciada por Trump, com previsão de vigência a partir desta sexta-feira (1º). O Brasil, segundo o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC), já participou de cerca de dez rodadas de negociações com autoridades norte-americanas, sem que um acordo fosse alcançado.
Em Nova York, onde participou de um evento sobre a Palestina, o chanceler Mauro Vieira comunicou a autoridades dos EUA que está disposto a se deslocar a Washington para dialogar diretamente, caso algum membro do governo Trump aceite recebê-lo. Até o momento, não há confirmação oficial de agenda, mas interlocutores afirmam que os bastidores seguem ativos.
No Palácio do Planalto, auxiliares de Lula manifestaram preocupação com o comportamento imprevisível de Trump em encontros bilaterais e afirmam, também sob anonimato, que uma conversa com Lula exige um roteiro estabelecido em comum acordo entre os dois governos.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, reforçou nesta terça-feira (29) a importância de uma mediação diplomática prévia. “É nosso papel, como ministros, azeitar os canais para que a conversa, quando ocorrer, seja respeitosa, edificante e valorizadora para ambos os povos. Não pode haver subordinação nem sentimento de vira-latismo”, defendeu.
Além da questão tarifária, Trump tem inserido elementos políticos nas tratativas. Em uma carta enviada a Lula, mencionou a situação jurídica do ex-presidente Jair Bolsonaro, atualmente réu no Supremo Tribunal Federal (STF) por tentativa de golpe, abolição violenta do estado democrático de direito e organização criminosa.
Em resposta, o governo brasileiro reafirmou que está aberto ao diálogo comercial, mas não aceita interferências políticas. “A soberania do Brasil e o estado democrático de direito são inegociáveis”, declarou o MDIC. “A negociação será sempre baseada no diálogo e livre de contaminações ideológicas.”
Haddad, por sua vez, destacou que há indícios de que o governo norte-americano esteja disposto a conversar. “O Brasil vai estar preparado para cuidar das suas empresas e dos seus trabalhadores”, afirmou.