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Monday, 15 de September de 2025 - 11:07:16
Favela do Moinho enfrenta despejos, operações policiais e risco de gentrificação
CONFLITOS URBANOS EM SÃO PAULO

No coração de São Paulo, entre os bairros Campos Elíseos e Bom Retiro, a Favela do Moinho surgiu nos anos 1990 em um terreno industrial abandonado após a falência do Moinho Central. Desde então, a comunidade tem sido palco de disputas marcadas por incêndios devastadores, repressão policial, batalhas judiciais e denúncias de gentrificação.

A luta dos moradores por permanência resultou em 2008 no reconhecimento provisório de usucapião pela Justiça Federal. A vitória, contudo, foi revertida em 2024, abrindo espaço para retomada da área pelo mercado imobiliário e intensificação de pressões pelo despejo. Segundo urbanistas, a valorização da região se relaciona diretamente à futura instalação da sede do governo paulista, ampliando a política de “higienização social”.

O Moinho também acumula episódios trágicos. Incêndios em 2011 e 2012 deixaram centenas de famílias desabrigadas, reforçando a percepção de moradores de que tragédias serviam como pretexto para remoções. Já em 2017, sob gestão de João Doria (PSDB), a Prefeitura anunciou a retirada da comunidade, associando-a ao tráfico — narrativa que, segundo especialistas, justificou ações de repressão e violência.

Mais recentemente, em setembro de 2025, o Ministério Público deflagrou uma operação que prendeu dez pessoas, entre elas a líder comunitária Alessandra Moja, acusada de atuar em defesa do irmão Leonardo Moja, apontado como chefe do tráfico local. Para a promotoria, a favela funcionava como “quartel-general” do PCC na região central, sustentado por tráfico, extorsão e lavagem de dinheiro.

Enquanto autoridades citam riscos de segurança e presença do crime organizado, moradores e pesquisadores defendem que as operações fazem parte de um projeto de expulsão das populações pobres do Centro. “O Moinho é símbolo da resistência contra a expulsão da população pobre do coração de São Paulo”, afirma o documentarista Caio Castor, que viveu no local e prepara um longa sobre a comunidade.

Até julho de 2025, cerca de 441 famílias já haviam deixado a área. Casas foram demolidas, emparedadas ou descaracterizadas. Ainda assim, muitos moradores resistem. “Nossa vida está aqui. A gente não quer ir embora, só quer condições dignas para continuar”, disse Renaci Marques, reciclador que vive na favela desde 1987.

Hoje, entre ruínas e incertezas, a Favela do Moinho permanece como símbolo do choque entre interesses imobiliários, políticas públicas falhas e a luta de centenas de famílias por direito à moradia no centro da maior metrópole do país.

Texto/Fonte: G1