A despesa total do governo avançou 12,45% em termos reais em 2023, ultrapassando a marca dos R$ 2 trilhões, algo que só havia acontecido anteriormente em 2020 -- ano marcado pela forte expansão de despesas extraordinárias relacionadas com a pandemia da Covid-19.
DESPESA TOTAL DO GOVERNO FEDERAL
EM R$ TRILHÕES (VALORES CORRIGIDOS PELA INFLAÇÃO)
1.6831.6831.7911.7911.8251.8251.8051.8051.7861.7861.8211.8211.8711.8712.4522.4521.8741.8741.9231.9232.1622.16220132014201520162017201820192020202120222023050010001500200025003000
2014
1.791
Fonte: TESOURO NACIONAL
O aumento de gastos em 2023 contribuiu para a piora das contas do governo, que registrou um déficit primário de R$ 230,5 bilhões no último ano.
O déficit primário ocorre quando os gastos do governo superam a arrecadação com impostos --o pagamento de juros da dívida pública não é considerado nesse caso. No sentido inverso, quando as receitas superam as despesas, há superávit.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que parte desse aumento de gastos está relacionado com o pagamento de precatórios postergados pela gestão anterior, no valor de R$ 92,4 bilhões.
"O que a gente tem que considerar é que esse resultado [de 2023] é a expressão de uma decisão que o governo tomou de pagar o calote que foi dado (...) Então desses R$ 230 bilhões [de déficit em 2023] , praticamente a metade disso é pagamento de dívida do governo anterior que poderia ser prorrogada para 2027 e que nós achamos que não era justo", disse o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, nesta segunda-feira (29).
Ritmo de crescimento das despesas do governo
Em termos reais - acima da inflação
19981999200020012002200320042005200620072008200920102011201220132014201520162017201820192020202120222023-30-20-10010203040
2001
● : 8,46
Fonte: Tesouro Nacional
Na comparação com o Produto Interno Bruto (PIB), a despesa total do governo atingiu 19,6% do PIB em 2023. Trata-se do maior patamar desde 2020. Sem contar a pandemia, é o maior valor desde 2016 - quando somou 19,9% do PIB. O Ministério da Fazenda informou que, sem o pagamento dos precatórios, a despesa primária representaria 18,8% do PIB em 2023.
DESPESA TOTAL NA PROPORÇÃO DO PIB
2013201420152016201720182019202020212022202316182022242628
Fonte: TESOURO NACIONAL
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Haddad anuncia pacote para aumentar a arrecadação e zerar déficit no ano que vem
O aumento do rombo nas contas públicas no primeiro ano da nova gestão está relacionado, principalmente, com a alta das despesas autorizada por meio da PEC da transição, aprovada no fim de 2022 pelo governo eleito do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Com a mudança, o governo obteve autorização para gastar R$ 168,9 bilhões a mais no ano passado.
Parte do valor foi usado para tornar permanente o benefício de R$ 600 do Bolsa Família. Também foram elevados gastos em saúde, educação, bolsas de estudo e merenda escolar, entre outras políticas públicas.
"A dinâmica da expansão de gastos nessas áreas corresponde ao objetivo anunciado pelo presidente Lula ainda em sua campanha de 'colocar o pobre no orçamento', ampliando os investimentos sociais e as transferências de renda para famílias mais necessitadas. A retomada e inauguração de políticas públicas essenciais para a vida da população de baixa renda marcou a reestruturação da estratégia de política fiscal", informou o Ministério da Fazenda, nesta semana.
Além do pagamento de precatórios postergados pelo governo anterior, outro fator que elevou as despesas foi a decisão do governo Lula de compensar perdas de arrecadação dos estados com a redução da alíquota do ICMS (um tributo estadual), registrada no governo Bolsonaro. A compensação somou R$ 22,5 bilhões até 2023.
Para tentar evitar uma piora maior das contas públicas, a equipe econômica tem atuado, principalmente, no aumento de arrecadação.
Com esse objetivo, foram aprovadas as seguintes medidas:
O objetivo do governo é que esse o aumento de arrecadação com estas medidas equilibre o orçamento de 2024, ou seja, que o déficit seja zerado.
Essa meta, que consta na Lei de Diretrizes Orçamentárias deste ano - aprovada pelo Legislativo, é considerada ousada pelo mercado financeiro. Os analistas estimam um rombo de cerca de R$ 90 bilhões em 2024.
Apesar das medidas de aumento de arrecadação, economistas têm criticado a ausência de ações mais concretas por parte da área econômica para cortar outros gastos públicos.
Entre as medidas propostas, estão uma reforma administrativa, uma nova reforma da Previdência, o fim do abono salarial e mudança nas regras para gastos sociais, entre outras.
O governo tem prometido que cortes de despesas também serão avaliados. Entretanto, nenhuma medida de peso foi enviada até o momento ao Congresso Nacional.
Em meados de janeiro, o Ministério do Planejamento informou ao g1 que o grupo de trabalho de revisão de gastos públicos e renúncias fiscais "está trabalhando dentro dos prazos previstos".
De acordo com o economista Guilherme Tinoco, pesquisador associado do FGV IBRE, a despesa do governo foi "significativamente" aumentada em 2023, e as regras do novo arcabouço fiscal fazem com que ela cresça todo ano.
"E isso coloca um peso muito grande no lado da arrecadação para fazer um ajuste. É o que o governo tem tentado, mas é difícil colocar tudo no lado da receita", acrescentou.
Segundo ele, se a economia brasileira continuar crescendo, a um ritmo de 2,5% a 3% ao ano, será possível continuar fazendo o ajuste das contas públicas por meio do aumento da arrecadação, fechando brechas que reduzem o pagamento de tributos como propõe o ministro Haddad, sem elevar alíquotas para toda população.
"Enquanto a economia internacional estiver indo bem, tiver um movimento de menor aversão ao risco. Enquanto estiver funcionando bem no mundo, essa velocidade mais lenta [do ajuste fiscal, com metas não sendo atingidas, como prevê o mercado] é menos problemática. Mas se tiver uma inversão grande do humor externo, mercado pode ficar um pouco mais tenso com esse déficit (...) O problema é se a economia não crescer. O ajuste fica super difícil", concluiu o economista Guilherme Tinoco.