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Friday, 01 de August de 2025 - 13:44:33
Impacto do tarifaço dos EUA pode alterar preços de carne, tilápia e frutas no Brasil
ECONOMIA GLOBAL E AGRONEGÓCIO

O tarifaço imposto pelo presidente Donald Trump sobre produtos brasileiros deve afetar o mercado interno de forma indireta, provocando alterações nos preços de diversos alimentos. Embora a sobretaxa — que atinge até 50% em alguns casos — seja direcionada às empresas dos EUA que compram do Brasil, seus efeitos podem ser sentidos por consumidores brasileiros.

Especialistas avaliam que os principais produtos afetados são carne bovina, tilápia, café e frutas, como manga e uva. A depender da demanda dos EUA, esses alimentos podem sofrer tanto com quedas quanto com elevações nos preços no mercado doméstico.

No caso da carne bovina, a expectativa é de uma alta nos preços nos próximos meses. Segundo Wagner Yanaguizawa, especialista em proteína animal do Rabobank, mesmo sem o tarifaço, já havia uma redução prevista no número de abates devido à retenção de fêmeas para reprodução. A sobretaxa, no entanto, pode acelerar essa tendência, caso haja queda nas compras americanas.

No curto prazo, porém, os preços da carne podem cair, segundo o Itaú BBA. Isso ocorre por causa da diminuição no custo da ração e da queda recente no preço do boi gordo — que recuou 7,21% em julho, conforme dados do Cepea. Além disso, a China, principal compradora da carne brasileira, está pressionando por valores mais baixos. No entanto, a expectativa é que essa baixa dure pouco, já que a oferta global também está em declínio, com concorrentes como EUA e Austrália enfrentando problemas sanitários.

Já no setor de tilápias, o impacto tende a ser mais imediato e pronunciado. Cerca de 90% das exportações brasileiras do peixe são destinadas aos EUA. Com a aplicação da tarifa de 50%, a produção deverá ser redirecionada ao mercado interno, ampliando a oferta e pressionando os preços para baixo. Francisco Medeiros, presidente da PeixeBR, avalia que isso poderá beneficiar o consumidor, mas também alerta para riscos à sustentabilidade do setor.

Matheus Do Ville Liasch, do Cepea/USP, afirma que o repasse da queda ao consumidor será gradual, começando pelos produtores e passando por frigoríficos até atingir o varejo. Ainda assim, Eduardo Lobo, da Abipesca, adverte que absorver o volume destinado à exportação pode ser economicamente inviável, o que poderia causar colapsos na cadeia produtiva.

No caso do café, os efeitos do tarifaço devem demorar mais a aparecer. Para Celírio Inácio, da Associação Brasileira da Indústria de Café (Abic), a expectativa é de que os embarques aos EUA continuem normalmente por ora. Isso evitaria um excesso de oferta no mercado interno e manteria a tendência de queda nos preços, puxada pela previsão de aumento na colheita do café robusta — menos consumido pelos americanos, que preferem o arábica.

Fernando Maximiliano, da StoneX, lembra que os estoques dos importadores americanos ainda garantem alguma estabilidade de preços, e que embarques feitos até 6 de agosto não sofrerão as tarifas de 50%. O grande ponto de interrogação está na duração do tarifaço. Caso ele se estenda por muitos meses, os EUA poderão buscar novos fornecedores e o Brasil, por sua vez, teria de encontrar outros mercados. Isso criaria um novo equilíbrio de preços, com oscilações tanto para cima quanto para baixo.

Segundo Marcos Matos, do Cecafé, esse cenário tornaria o mercado brasileiro imprevisível. Já Inácio alerta que uma queda prolongada nos preços pode desestimular a produção no longo prazo, caso os agricultores deixem de investir.

O mercado de frutas também tende a sentir os efeitos do tarifaço, especialmente durante o segundo semestre, período de colheita de mangas e uvas no Vale do Rio São Francisco. Com as tarifas, o volume que normalmente seria exportado aos EUA pode permanecer no país, derrubando os preços. Lucas Bezerra, do Cepea, explica que, diferentemente da pecuária, o setor frutícola não pode reter produção: frutas perecíveis precisam ser colhidas e vendidas.

A dificuldade em redirecionar essas exportações para outros mercados também agrava a situação. “Não temos um parceiro comercial suficientemente grande para absorver essa quantidade de fruta”, ressalta Bezerra.

Com esse cenário, o tarifaço, embora não atinja diretamente o consumidor brasileiro, pode provocar uma reconfiguração significativa nas cadeias de produção e nos preços de alimentos. Seja por aumento de oferta no mercado interno, redirecionamento de exportações ou mudanças na produção, os efeitos das decisões comerciais de Washington devem, cedo ou tarde, bater à porta dos supermercados brasileiros.

 
Texto/Fonte: G1